terça-feira, 26 de maio de 2020

CABEÇA DE ARTISTA

Não tente entender
a cabeça de um artista.
Jamais.
Não há ordem,
roteiro
ou paz
na cabeça dessa gente.
A frente,
às vezes,
fica lá atrás.
Tem filme que começa
no fim,
alguns livros
também são assim.
Quando um compositor
começa uma letra,
você pensa que ele imagina
como ela termina?
Jamais.
Não há paz
na cabeça do artista.
Barulhos intermináveis
barulham em nós,
todo artista ouve voz,
nem sempre do além.
E quando temos um bem
artistamos nossa arte
também para ele ou ela.
Quando abrimos nossa janela,
vemos muito mais
do que uma pessoa
que tem paz
na cabeça.
Vou contar o caso específico
do artista escritor.
Um escrevedor
beira a loucura.
Nós que produzimos,
que vivemos a literatura,
nem de longe,
somos normais.
Não há paz em nós.
E cada escrevedor
tem alguma frescura.
A minha?
Não decoro um único poema
de minha autoria.
Se decoro de outros poetas?
Sim, decoro com facilidade.
A cada texto que escrevo
sinto uma felicidade
que não sei explicar ao leitor.
A minha cabeça de escrevedor
barulha sem fim.
Há tanta coisa em mim:
barulhos,
sorrisos,
vozes,
alegrias,
dores,
amores,
esperança,
desesperança...
há uma insconstância
que me desespera.
Meu corpo quieto
é enganoso
para o que acontece
na minha cabeça,
onde há uma fervura
que não para de ferver.
Eu sempre quero dizer,
seja em verso,
seja em prosa,
seja em silêncio
ensurdecedor.
Eu gosto de flor
porque flor barulha
e explode em cores.
As mais encantantes
são as vermelhas,
porquem vermelham
o nosso jardim,
e eu gosto tanto
do verbo vermelhar!
Você acha que eu sei
como vai terminar
esse poema?
Não tenho noção!
Às vezes,
escrever é maldição,
outras vezes é paraíso,
do verbo paraísar:
Eu PARAÍSO
no sorriso da Cris.
Exemplifiquei.
Nem sempre eu sei
o que se passa na minha cabeça.
Às vezes só descubro
enquanto escrevo.
Às vezes me atrevo
a me surpreender
com o que descubro
em minha cabeça de escrevedor.
Também sou leitor
de mim.
Poeta é assim.
Não tente entender
a cabeça de um escrevedor.
Ele se fragmenta para o leitor.
Limite-se ao fragmento compartilhado,
não queira entender sua totalidade,
sob pena de enlouquecer
enquanto ele normalidade.

ISAC MACHADO DE MOURA